Canção da Pirâmide


Eu pulei no rio e o que eu vejo?
Anjos de olhar negro nadando comigo
Uma lua cheia de estrelas e carros astrais
Todos os elementos que eu costumava ver.

Todos os meus amores nadavam comigo
Todo o meu passado e futuro
E fomos para o céu num pequeno bote
Não há nada a temer nem a duvidar


por Thom Yorke (RadioHead)

Ofélia


O dia está lindo!
Pássaros cantam. E as borboletas?
Indo e vindo junto àqueles numa bela sincronia
Enfeitando minha janela que brilha à luz do dia.

E eu aqui em minha cama.

As ruas estão quietas, calmas.
Mas nada acalma minha alma
Que inquieta me faz suar e tremer
Tua face, Ofélia, impede-me de meu livro ler.

E continuo aqui em minha cama.

Meu cão vem a mim, acariciar,
Rouba-me do rosto um sorriso demorado
Semelhante àqueles que sorri junto a ti, Ofélia,
Enquanto recitava na fria areia da praia durante o luar,
Os mais belos versos de amor
Que só um poeta apaixonado poderia declamar.

Lembrei de ti sozinho em minha cama.

Tantas canções para cantar, paisagens para admirar
E poesias para chorar... Mas estou aqui
Atordoado com o mau cheiro, vegetando ao teu lado,
Porque sou teu namorado e preciso cuidar de ti.

Te amo sentado em minha cama.

A culpa é tua, Ofélia, preciso confessar.
Por que morreste logo hoje e não outrora?
Por que não amanhã, mas agora?
Por que, maldita?

Tua morte inevitavelmente me causou tremendo desgosto,
Tua imagem me perseguirá eternamente.
Tua imagem! Ah, tua imagem! Ficará vidrada em minha mente...
Só me resta agora espantar os mosquitos
Que pousam em teu fétido rosto.

Carta a um amigo


Tu, que dominas pedaço de minha alma,
Que no baixo da tristeza me faz crescer,
E no momento de fúria me acalma,
Por toda companhia, amigo, devo agradecer.

Me fizeste pensar mais uma vez
Quando eu gritava inseguramente
Que viver não vale a pena
Mas que uma pena pode me fazer viver.

Me fez levantar, outra vez,
Depois da última queda,
E quando quase desisti, mostrou-me
Que lágrimas regam a felicidade.

Entendeu-me, perdoando-me
Pelas falhas para contigo,
Quando quase de raiva chorei, sozinho,
Gritando que fui a causa de sua desgraça,
Que sou o dono do inferno, da sua dor, seu lobo,
Mas que mesmo assim seria seu melhor amigo.

O tempo passa... sempre
Um dia tudo tenderá a se desfazer... lentamente,
Mas não importa a força do tempo...
Mesmo morto, amigo, ainda estou ao teu lado.

Mulher Exata


Ela adora me transtornar,
me beijar, me dar afeto,
me envolver com suas pernas
que em mim fazem um ângulo reto.

Suas pernas são longas, compridas
A soma dos quadrados de quaisquer catetos
Guardando aqueles quadris
de raio imensurável.

Vamos encontrar a fórmula, a solução
dessa equação amorosa de segundo grau,
que nem delta nem logaritmo
poderão achar o módulo dessa função.

Ó céus, conserva naquela mulher aquela base,
nos eleva à potência máxima,
e nos inclua, por definição,
num conjunto infinito.

A física dela... nem se fala!
O seu trabalho é incomparável,
Independente do atrito, pois nesse sistema
nossa tração e atração são sempre positivas.

Não deixe esse amor ser tangencial
e sim em força centrípeta constante,
em que sejas sempre atraída
pela nossa relação resultante.

Despreze tua resistência, mulher,
Deixando que as partículas opostas se atraiam
e que ângulos formem arcos
com deslocamento de 2π radianos.

Seu campo gravitacional me enlouquece,
Me tira do sério, me arrebata,
Dentre as mulheres que amei
Ela foi a mulher exata.

Mais que uma pedra


De volta ao início,
Lembrando de tudo que nos levou ao pó.
Você está bem
Enquanto aqui engulo seco na ponta do espinho

Não pense que vai ser fácil
Apagar nosso passado
Desabamos, nos destruímos,
Terminamos o que nem começamos

Hei, me dê a chance
De voltar a ser eu
Não me cegue
Com a ponta de sua agulha
Sei que pra você
Não sou mais que uma pedra
Mas não me deixe sozinho
De novo

Não consigo extrair
O que acumulei na garganta como o pus no meu sangue
Não me importa os restos de vida agora
Na minha mente falecida

Você me levou ao ponto mais alto
E depois me derrubou
Deste céu azul
Para com meus olhos cinzentos.

Neste céu de trevas
Com seus raios de fogo
Que me queimaram
E me consumiram intensamente

Mas de nada valerá
Dentro dessa minha concepção
Nos meus sonhos ilusionistas
Se ascendem um recomeço.

Coração Sombrio


Ela é um poço melancólico
Com os pés descalços no chão.
Seus braços estendidos pro céu
não me enganam, pedem perdão.

Mas logo ela que desde nascida
É presa com seus pecados,
Totalmente fixada em angústia e rancor
Que lhe fazem crescer e chorar.

Não me diz
Que és a mais feliz
Dentre aquelas que te envolvem
E suplicam antes de partir.

Como um ser tão paranóico e sombrio
consegue sorrir?
Louvando com seus vários membros
Àquele que a fez emergir

Pobre criatura, percebas que és
inotável entre nós.
Sei que tua rebeldia e loucura
podem fazer tudo cair.

Tua vida é mais longa do que eu pensei...
É mais um azar ou só uma sorte?
Rezo sempre por você porque sei que um dia
Alguém te levará ao teu leito de morte.