Mateus 27:5

Eis que no verão há uma rosa que se fecha
Eis que no grito há um som que não se propaga
Eis que nas trevas há uma vela que se apaga
Eis que na guerra há uma lança que não se flecha.

Pálida a rosa tímida que ao sol fraqueja
Pétalas de tão finas, frágeis, estremecem
Sépalas, de tão puras, débeis, enlouquecem
No meigo toque da moça que à rosa beija

Sou a vela consumida ao amanhecer,
A esperança que se compra sem mais valer,
O fogo que em trevas se ofusca ao pó da terra,

Sou a lança que na bonança se abandona,
A muralha que em tempestade desmorona,
Sou o soldado que se oculta ao caos da guerra.

Metalinguagem

E a poesia?
Perdida. Talvez presa em alguma artéria
Em algum refúgio de minha deteriorada memória
Ou num deleite de meu dia inacabado
Engasgado no calor de minha voz tão séria.

Perdeu-se o verso
Na luz que se ofusca adormecida em minha retina?
Ou na ansiedade que corrói dos meus dedos a queratina?
No ranger de meus vocábulos decadentes
Quiçá nos fios de água correntes
Em meus esbranquiçados cabelos vestidos de tédio.

Calou-se o berro,
Uma vez que no vácuo de minhas desinências eu o enterro
Definhá-lo-ei, fundi-lo-ei em tungstênio e ferro!
Minhas lamúrias substanciaram-se em estrôncio e césio
Cristalizadas em raios catódicos durante uma propulsão iônica
Filtro o tempo, dilato-o, sintetizo-o, isomerizo-o... Nego-o!